quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Ordem Mendicante - História da Igreja

As ordens mendicantes tiveram sua origem em meios as transformações sócio-política-econômica que passava a Europa. Na verdade é uma reação de parte da igreja aos novos valores capitalistas que ascendiam em detrimento do feudalismo decadente de seus dias.
A burguesia em ascensão punha em cheque a maneira de ver e pensar a vida própria da nobreza até então hegemônica em todo o continente europeu. Um novo conceito de riqueza surgia, não mais baseada na posse da terra, mas no acúmulo de moedas. O desenvolvimento econômico punha lado a lado ricos e pobres, estes últimos sem a delicada proteção e a subsistência extraída do feudo.
A discussão sobre a riqueza já fazia parte do dia-a-dia dos homens de letra e posses dos séculos XII e XIII. Ser rico em meio a um exército de miseráveis causava um certo desconforto. Dentre os muitos incomodados encontrava-se Pedro Valdo. Comerciante de Lyon, homem rico segundo os novos tempos, um burguês que de certa forma estava descontente com as transformações do seu mundo. Pedro Valdo é despertado em sua sensibilidade quando ouvi a lenda de São Aleixo.
Despertado a servir a pobreza viaja até Roma onde se coloca a serviço da igreja, contudo é rejeitado por seus interrogadores. No momento a igreja não havia percebido a profundidade do movimento, nem tão pouco entendia com clareza as mudanças que se processava a sua volta. Diante disto Pedro Valdo é proibido de pregar ao povo a sua doutrina, salvo com o consentimento do bispo local que na ocasião era seu principal opositor.
Quem poderia parar os valdenses em sua missão? Nada. Diante da perseguição proposta pela igreja e seus aliados, os seguidores de Pedro Valdo fogem para a região dos Alpes onde se juntam ao movimento de pobres de origem lombarda formando uma frente política nada simpática ao papado. Quando a reforma protestante surgiu na Europa muitos dos valdenses aderiram aos reformadores. O movimento valdense entra para a história da igreja como uma heresia, contudo, foi precursor do movimento franciscano que viria logo a seguir.
Giovanni [João], fundador da ordem franciscana, pertencia a mesma classe e tipo de família da qual provinha Pedro Valdo. Sua decisão para o ministério com os pobres ocorre na idade de 20 anos e depois de uma drástica experiência no campo de batalha. Certamente pôde contemplar a miséria humana e em seu íntimo e resolveu modificar essa realidade junto aos seus patrícios. Os valores burgueses baseados no lucro, na concentração de riquezas e na violência como instrumento de defesa dos seus interesses o levou a desprezar este estilo de vida que tanto sofrimento e dor causava aos seus contemporâneos.
Como testemunho da sua decisão renuncia a sua herança e busca ajuda papal as suas pretensões religiosas. Inocêncio III, o papa mais poderoso da história da igreja o recebe com certo desdém, colocando em prova a sua convicção e resistência as circunstâncias adversas. Devido sua aparência lamentavelmente pobre, o papa manda procurar uma pocilga, visto sua semelhança com as condições em que vivia esse animal. Ele obedece ao papa e depois de um certo tempo volta a se encontrar com Inocêncio e reclama deste a sua autorização para fundar uma ordem religiosa. Inocêncio percebendo sua força moral concede a Francisco sua petição.
Os franciscanos obtiveram êxito onde os valdenses fracassaram, em parte pela visão do papa Inocêncio que sabia reconhecer a capacidade dos seus colaboradores e a dimensão que a nova ordem alcançaria no seio da igreja. Livre para pregar sua ortodoxia Francisco se esmera na passagem de Mateus 10. 7-10 e passa a se dedicar ao trabalho com os pobres.
Seu movimento inova em relação aos demais por diversos motivos:
·         Primeiro – Assume um componente evangelístico.
·         Segundo – Tem como campo de atuação os grandes centros urbanos da sua época.
·         Terceiro – Funda a ordem das Clarissa dando a mulher um maior espaço dentro da igreja.
A vida monástica, o isolamento dos religiosos cede lugar a interação com as populações urbanas. Havia uma igreja que alcançava a todos independente da sua origem familiar. A disposição destes homens era também uma resposta aos movimentos anabatistas que questionavam a vida desregrada do clero católico e a corrupção tão comuns as práticas religiosas. A ética Franciscana, assim como a Dominicana eram pontos positivos na luta da igreja contra os “heréticos”.
            São Domingos era doze anos mais velho que São Francisco. A semelhança do seu irmão na fé também criou uma ordem religiosa: os pregadores. Ao contrário dos franciscanos os dominicanos se esmeram nos estudos como forma de combater os hereges. A competência do seu fundador neste campo já havia sido posta a prova quando este e o bispo de Osma evangelizaram com relativo sucesso os cátaros [hereges franceses]. A adoção do monastério nos moldes dos monges agostinianos e o voto de pobreza no estilo franciscanos são marcas da sua organização. Franciscanos e Dominicanos formaram as ordens mendicantes da igreja.
Após a morte dos seus fundadores as ordens mendicantes cresceram por toda Europa. Os ideais dos seus fundadores aos poucos foram sendo modificados e o voto de pobreza radical começou a ser questionado na medida que o crescimento determinava a aquisição de propriedades. Esse fato causou profundas lutas internas e externa a ordem. No meio franciscano surgiram dois partidos que punham em xeque a ortodoxia do seu fundador: Rigorista e Moderados. Enquanto as facções dentro da ordem franciscana acirravam os debates sobre o voto de pobreza, os Pobrezinhos de Assis e os Dominicanos ampliavam sua área de atuação chegando também as universidades, onde esse mesmo debate ganhou ares academicistas.
A pregação aos hereges e o avanço sobre as novas terras recém descobertas aos olhos dos europeus logo demonstrou para a igreja o valor missionário desta legião de pregadores a serviço do papado. Nomes como Guilherme de Trípoli [Frente mulçumana], Vicente Ferrer [missões entre os judeus], João Monte Corvino [Pérsia, Etiópia, Índia e China] davam prova da força da igreja e como o papa Inocêncio acertou ao acolher Francisco e São Domingo a sombra da igreja.  As baixas frequentes nas frentes missionárias ao invés de afastar os novos conversos estimulava-os a prosseguir na pregação cristã.
Com João Montecorvino a representação papal chega a China e multiplicam de forma que João é nomeado arcebispo de Cambaluc. Outros mais são enviados para ajuda-los a desenvolver sua missão.
Na medida em que os avanços missionários iam se consolidando nas novas terras o debate acerca da pobreza absoluta versos riqueza ganha novos capítulos na Europa. Os franciscanos sob a liderança de João de Parma chegam próximo do rompimento com o papado. Caso ocorresse se repetiria o fenômeno dos valdenses.
Os espirituais como passaram a se autodenominar se apegam a doutrina de Joaquim Fiore (Monge Cisterciense – Doutrina - Era do Pai, do Filho e do Espírito Santo) afirmando que toda a igreja estava vivendo a era do Filho enquanto eles já vivenciavam a do Espírito Santo. A defesa radical da doutrina do seu fundador em meio à confusão de papas (1230 – Gregório IX determina que o testamento de Francisco de Assis não tinha valor de lei), líderes religiosos e até franciscanos moderados, esses últimos tidos como traidores da ordem, davam o tom da beligerância internas na qual mergulhara os Pobrezinhos de Assis.
A disputa interna suavizada entre os dominicanos e acirrada entre os franciscanos terá seu ponto final quando da chegada a ordem de São Boaventura. Esse novo prelado combina espirito místico com a mais estrita ortodoxia franciscana e coloca fora da discussão política João de Parma e seus seguidores que serão trancafiados nos conventos. Nova reação ocorrerá após a morte de Boaventura, contudo, com o estabelecimento de uma breve perseguição os Espirituais desaparecem.
O alto ideal da pobreza absoluta levado a bom termo por Francisco de Assis chega ao fim após uma grave crise interna na ordem que criou. Apesar de todo esforço do monge a ganancia humana associada as necessidades advindas do crescimento da própria ordem deixou claro a incapacidade de se cumprir o testamento do seu fundador.
 CONCLUSÃO
A ordem mendicante veio em meio a uma Europa em transformação. O medievo abria espaço para o mundo moderno com seus valores e dessabores que colocavam em xeque as práticas feudais conduzindo os homens a uma nova organização sócio-política e econômica conhecida mais tarde como capitalismo.
Em meio as mudanças haviam também as resistências. Trocar o ideal de coletividade pelo individualismo, a fé pela razão, os laços de fidelidade e compromisso pela desconfiança da nota promissora, largar o orgulho do guerreiro, dos atos de nobreza, da camaradagem nos campos de batalha pela recompensa do lucro certamente não era um ideal de vida que muitos homens do medievo desejavam. A miséria campeava onde antes existiam a solidariedade, daí também na religião, área sensível as mudanças se implantam as ordens dos mendicantes.
Eles reprovavam a ganancia e se apegavam ao humano. A dependência de Deus era mais valiosa que a segurança da riqueza. Eles entendiam que o mercado era para servir ao homem e que suas necessidades jamais poderiam ser satisfeitas em função dele. Pedro Valdo, Francisco, ambos ligados a nascente burguesia percebiam a incoerência de poucos terem muitos e muitos terem que curtir a miséria. Certamente a preguiça não era explicação única para a pobreza absoluta. Daí optaram por largaram aquilo que feria para se identificarem com os mais simples assim como a pregação do Cristo.
As ordens mendicantes além de humanizarem a relação da igreja com seu povo (muitos sacerdotes não representavam o povo o qual se diziam líderes) respondeu parte da crítica histórica dos chamados hereges ao mal procedimento daqueles chamados escolhidos de Deus. Para o papado foi um delicioso equilíbrio de forças a tanto desejado, porém nunca posto em prática por seus representantes mais celebres.

 BIBLIOGRAFIA


GONZALEZ, L. Justo. A era dos altos ideais: Uma história ilustrada do Cristianismo. São Paulo:
         Ed. Vida Nova. Volume 04. Ano: 2001.


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